O cidadão paga três vezes para suportar estádios construídos com dinheiro publico.
Na primeira estância, a cidade inteira paga e sofre, desviando dinheiro para sua construção. O que vai aos estádios não vai às escolas, saúde, meio-ambiente, transporte público. No caso da Copa do Mundo 2010, além de R$3,9 bilhões em nove cidades foram tirados. No caso da Copa do Mundo do 2014, o custo antes de começar as obras é além de R$6 bilhões. Se o orçamento quadriplicar (como o Pan 2007), seriam R$24 bilhões. Ou seja, R$2 bilhões por estádio.
Na segunda instância, @ torcedor@ precisará pagar custos elevados para assistir os jogos. A entrada do Brasileirão 2015 terá que atingir RS$40, e temos que lotar as arquibancadas. O publico médio de Brasileirão 2009 foi 17.601. A meio entrada por um jogo bonito no Maracanã, Junho 2010, foi R$19. Então, de onde vem mais 17.000 fãs dispostos pagar o dobro para tornar o projeto viável? É uma divida prevista. Essa situação já se espalhou na África do Sul.
Na terceira instância, o dono do estádio precisa pagar os custos de manutenção. Se um órgão publica for o dono, o povo pagará. No caso de Engenhão, a manutenção é R$450.000 por mês. O Botafogo tem que assumir essa carga de aqui há dois anos, quando a garantia expirasse. O clube Glorioso sobreviveria sem ajuda pública? As cidades da África do Sul não terão como manter esses estádios gigantescos e custosos. No Portugal estão falando já em demolir alguns estádios da Eurocopa 2004.
A cidade também sofre dos impactos urbanísticos e ambientais. O discurso de sustentabilidade, construção verde, e tal, não servem para nada se os espaços e o entorno dos estádios não se inter-relacionam com a cidade. E como é possível melhor o meio-ambiente quando você está aumentando consumo? O caso de Johanesburgo mostra que até as novas linhas de transporte estão causando muitos mais problemas que estão solucionando. O seja, a solução é pelo curto prazo (e para a dona da festa), os problemas sempre estarão.
Os casos de estádios desastrosos não faltam. Montreal, Wembeley, Atenas, Vancouver, o Ninho do Pássaro, o Pan. O que é surpreendente é que continuamos construindo-os do mesmo jeito. Se valesse o investimento, em concordância com lógica econômica, o capital (cada vez mais livre) teria chegado já. Mas esse não aconteceu na África do Sul, nem aconteceria no Brasil. Os estádios deles estão prontos, vamos lá.
De um ponto frio, os dez estádios são bonitãos, de alta qualidade. Pode passar horas investigando a arquitetura, técnicas, materiais, mão de obra. As tecnologias de iluminação, produção, transmissão são fascinantes e quase inacreditáveis. Posso receber um vídeo de um gol feito por um Norte Koreano em África do Sul no meu celular no Rio de Janeiro, menos de um segundo depois de acontecer. É.
O estádio é obra da arte, teatro, cenário, lugar de encontro, palco da festa, face da nação. Produz, reflete, e transforma a sociedade. Se não pensasse nos problemas, se você acredita, se você já esta salvado das necessidades cotidianas humanas, pode ate se ajoelhar e rezar na direção dos estádios da Copa. O Kaká, o seu Coca Cola, o seu Nike, o seu CBF, e a puta que te pariu estão lá liderando o choro. Mas também está lá seu Zé Ninguém Vuvuzela quem trabalhou no estádio e tem orgulho no seu produto. Também estão o pai, a mae, o filho, a filha, o primo, a vovozinha, e o povo africano (com certas limitações, obvio). A Copa vai deixar muito além de que podemos imaginar. Mas é verdade que os donos da bola, os donos de tudo, arrumaram uma festa de tamanho global com o dinheiro de povo. Sua festa muda de lugar cada quatro em quatro anos, e o dinheiro sempre vai à mesma direção, mas as memórias da Copa são de todos nos. Estar lá será um privilégio.
Enquanto eu sempre falo sobre o lado negativo de tudo que vejo no mundo esportivo (é porque não), eu gostaria ir a Copa, ir aos estádios. Gostaria saber o volume, a textura, o efeito na paisagem desses estádios. Eu gostaria ver, ao vivo, os maiores craques do mundo jogando para entrar na historia, na memória global. Eu gostaria encontrar com gente de tudo o mundo, conhecer África da Sul, os sul-africanos.O futebol é emocionante, é coletividade, é representação, é encontro, é o mundo.
A Copa faz das tripas coração. Dá para se perder num jogo de futebol. Dá para se emocionar, chorar, gritar, sacanear, festejar, deprimir, ficar fora de lugar e tempo. Dá para ver todos os jogos da Copa. Dá para fazer porra nenhuma por um mês. Mas é preciso entender que é a Copa é muito além do o que acontece durante 90 minutos de espetáculo televisual.
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